Precarização do Trabalho Parte 2: Trabalho emancipado (LEIA TAMBÉM EM FORENSE/GEN)
Quanto mais o capital se dirige para o
desenvolvimento e emprego das maquinarias e ciências naturais aplicadas, bem
como as de gestão, mais a superprodução se agiganta, com maior dispensa de trabalho
assalariado, trabalho vivo (capital circulante). Daí maior o tempo de trabalho
disponível concentrado de volta nas mãos da população excedente de
trabalhadores colocados no “não trabalho”, sem que exista mais as mesmas
possibilidades de lhes extrair a riqueza social na apropriação do mais valor, a
contragosto, claro.
Um ou outro ou mesmo um pequeno grupo de
investidores produtivos poderiam suspender suas atividades na velocidade e no quantum de produtos a serem entregues ao
mercado. Isto implicaria, por um tempo apenas, a diminuição da superprodução e
uma retração de reinvestimento em maquinaria e automação etc. Mas o que fazem
os concorrentes neste momento, aqueles que estão desejosos de monopolizar o
mercado ou o modernizar com novos produtos e serviços? A concorrência os impele
a serem eles os investidores, a derrubarem os entraves colocados pelos que se
abstêm de enfrentar novas demandas e novas tecnologias em nome de regulação da
produção relativamente ao consumo. A contradição troca de mãos, mas a
concorrência tendencial ao monopólio para ganhos
de escala e aprimoramento dos
produtos não para por aí – a lei geral da produção do valor e a motivação
da acumulação privada derruba a inércia de uns eliminando-os do mercado. Logo,
é necessário manter-se de algum modo na esfera do monopólio e da inversão de
parte do valor geral social em capital fixo, “descartando” sucessivamente o
trabalho vivo das atividades diretamente produtivas, engrossando as fileiras da
população ativa na ociosidade, no mundo do “não trabalho”, da produção
criativa, ou ociosidade estética.
É real a percepção e afirmação que o mundo do
trabalho hoje é precarizado e que os trabalhadores assalariados estão sujeitos
às mais aviltantes e desumanas condições em suas atividades. Um exemplo
contundente pode ser o dos trabalhadores precarizados nas atividades de
telemarketing, bem como aquelas em que os serviços exigem rapidez de confecção
e entrega (delivery). O processo
industrial de produtividade, estandardização e especialização também chegaram
às atividades de serviços, como, por exemplo, os de vendas e entregas por
aplicativos (app) instalados em smartphones. A precarização do trabalho
vista nestas atividades é fato, mas isto não nos autoriza a imaginar que este
seja uma simples “troca de endereço”, simples deslocamento, da exploração de
mais valor em condições degradantes análogas ao efetuado na indústria nos
últimos 200 anos, e que veio para permanecer assim.
De fato, não nos parece satisfatório apregoar a
precarização do trabalho assalariado apenas para localizar em atividades
diferentes as mesmas condições de exploração dos trabalhadores do capital. O
modo de produção capitalista obriga a sucessivas transformações produtivas,
portanto, nas relações de trabalho e nas relações pessoais, sociais e gerais.
Existem deslocamentos de trabalho industrial para o de serviços, e já agora o
de serviços para as atividades ligadas à filantropia, ao voluntarismo, à
economia solidaria e à cultura e lazer. Por isso o capital sempre necessitará
de mão de obra transitória e sempre
terá que reduzir os benefícios desses trabalhadores para que a acumulação se
prolongue – esta é a lógica do sistema de livre mercado. Nada de novo aqui:
isto implica a continuidade, por outras formas, dos mesmos termos da especulação
do capital como aviltamento dos trabalhadores e precarização de suas condições
gerais de trabalho, em alguns setores mais, outros menos.
Os que veem a precarização ressaltam que “[...] por
meio desse processo [do emprego da máquina], o quantum de trabalho necessário para a produção de certo objeto é
reduzido a um mínimo, mas só para que, com isso, um máximo trabalho seja
valorizado em um máximo de tais objetos.” (MARX, 2011, p. 585). Mas nós podemos
ver como Marx logo em seguida, e nem sempre convenientemente frisado, sabia e
esclareceu que essas mesmas condições eram as condições necessárias à
emancipação da classe trabalhadora e do homem genérico da necessidade premente
do trabalho econômico: “O primeiro aspecto é importante, porque o capital aqui –
de forma inteiramente involuntária – reduz o trabalho humano, o dispêndio de
energia, a um mínimo. Isso beneficiará o trabalho emancipado e é a condição de
sua emancipação.” (MARX, 2011, p. 585).
Toda a construção que se segue no texto de Marx (Capital fixo e desenvolvimento das forças
produtivas da sociedade) é soberba. Muitas vezes se afirma, empobrecendo
sua obra monumental, que o sistema de livre mercado estabelece em si uma
relação derivacionista entre a
produção e as formas culturais, cuja análise estática da economia não alcança a superação do sistema por seus
próprios meios, por seus termos, como Marx tanto o enfatizou. A dinâmica da
totalidade social é, sem dúvida, potencialidade efetiva da formação social
produtiva, do desenvolvimento das forças produtivas e das relações
estabelecidas pelos agentes para este fim.
_______________________________
MARX,Karl. Capital fixo e desenvolvimento das forças produtivas da sociedade. In: Grundrisse. São Paulo: Boitempo, 2011.
Comentários
Postar um comentário
Agradecido pela participação. Verifique se seu comentário foi publicado.