O Ser e a Política (Palestra UNIVASF-02/08/)


Eu fui convidado para falar de Ciência Política e incentivado a falar um pouco de minha trajetória pessoal como alguém que se formou em Ciências Sociais. Se me faço entender, percebam que já comecei a falar de política e, obviamente, isso vocês já perceberam, já comecei a falar de mim. Inaudita essa fusão, muitas vezes para muitos estranha, mas não tão difícil assim de ser entendida para os espíritos abertos e interessados em serem donos de seus destinos. Só tem uma coisa irrevogável para quem quer se dedicar às Ciências Sociais: amar os homens! Desculpem se desde o início pareço tão pouco “científico” com a palavra “amar”, mas a verdade é que depois de 30 anos dedicado aos estudos sociais e mais de 20 anos como docente universitário, a frase mais importante da minha vida, e que me levou à academia, não estava em nenhum livro das centenas que comprei muitas vezes sem condições econômicas para tal, e dos demais que li, emprestados, nas bibliotecas etc; a frase mais importante, como eu dizia, aquela que me levou para sempre a defender e dedicar-me aos estudos, estava em um cartaz de propaganda de uma empresa multinacional, pendurado na parede do departamento de compras da primeira empresa que trabalhei na vida e no Brasil, o Pão de Açúcar, onde fiquei por 11 anos; esse cartaz reproduzia a terra rachada calcinada de nosso sertão e a frase dizia: “Não importa de onde vens, importa o que podes fazer pelo lugar onde estás”. Eu sei que vocês devem estar a pensar que obviamente o cartaz, como se diz no dito popular, “puxava a brasa para a sua sardinha” (homenagem a minha mãe!). Não somos inocentes, mas somos gente! E para um futuro cientista social é isso que importa: perceber o que realmente faz a diferença, e ser gente, ser humano. Sem humanidade, sem amor ao próximo nada do que vocês possam ler, escutar de vossos mestres e estudar, fará sentido algum para vocês mesmos se por trás não estiver sempre presente na vossa carreira o amor ao próximo.
Tudo deve estar parecendo muito bonito ou “romântico para vocês”, talvez pareça inusitado o que comecei por falar, peço desculpas pela emoção que me envolve, este é um momento especial para mim e não tenho vergonha de afirmá-lo publicamente. Não tenham vergonha de usarem o que sabem e viveram e o que ainda vão aprender e viver em prol do vosso semelhante. Se deixarem vossos espíritos se empedernirem e tornarem-se frios e objetivistas demais, não poderão ser bons cientistas sociais, não bons o suficiente, porque não poderão fazer a diferença.

Mas tudo bem, vamos falar um pouco de política, certo?! Aproximadamente há três mil anos os homens fazem ciência política. Vejam que eu estou pensando em algum tipo de pensamento organizado e estruturado de convivência social, organização essa que possibilita que as gerações seguintes possam entender e praticar essa convivência, e a partir daí modificá-la, espera-se que para melhor, o que nem sempre acontece, pois a história não é uma linha reta ascendente, mas feita de obstáculos, desvios e retrocessos, ainda que em uma determinada visão esses “retrocessos” (entre aspas), seja a preparação para algo novo qualitativamente melhor. Aqui sugiro leituras como “A Cidade Antiga” de Coulanges de Foustel e talvez as obras de Friedrich Engels, o amigo e companheiro de Marx, ainda a meu ver pouco lido, “Introdução à Dialética da Natureza”, “Sobre o Papel do Trabalho na Transformação do Macaco em Homem” e ainda “A origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado” (todos escritos no século XIX). Este último inspirado em Jean-Jacques Rousseau (autor do século XVIII) “Discurso sobre a origem e os fundamentos da desigualdade entre os homens” e do “Contrato Social”, obra dos revolucionários franceses.
Eu disse ciência política, mas não política – política todos nós fazemos a cada instante quando orientamos nossas ações pelas expectativas dos outros (esta é uma definição de Max Weber que eu gosto) -, ou pelo simples fato de que a convivência social é sempre uma relação de dois ou mais indivíduos, ali existirá a política, não apenas como forma de governo ou administração da coisa publica, mas dos limites necessários à convivência entre indivíduos. Na verdade fazemos política o tempo todo, em casa, na família, na escola, no trabalho, enfim.

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Comentários

  1. Professor, foi uma honra e uma experiência inesquecível assistir à sua palestra. Esperei ansiosamente pelo texto que é de uma afetividade e de uma objetividade admirável. Afetividade que quando desvinculada da escolha e do exercício profissional torna seus resultados indiferentes, inertes, vãos.

    Nas suas palavras, "ou certo sentimento está em nós ou o que aprendermos não fará diferença."

    Muito Obrigada! Abraço.

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  2. Professor você é uma pessoa admirável,e digno de seus conceitos,ética e acima de tudo sua honra.
    A grandeza não consiste em receber honras, mas em merecê-las.
    (Aristóteles)
    Você é o espelho desta frase.

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  3. Boa Noite professor.Nós brasileiros devemos sempre batalharmos por um pais justo e sem corrupção,mas para essa batalha devemos voltarmos onde tudo começou, nas revoluções que se tornarão um grande desenvolvimento para o nosso pais isso analisando quem nos elegemos para debater os nossos direitos.Isso é um batalha que vai demorar eu não sei o quanto,Mas se um dia mudar seremos uma nação feliz nesse sentido.Mas em outros sentidos deveremos mudar os nossos meios de agir em pro da sociedade.Desculca se eu estou errado,mas ainda tem muita coisa errada nesse pais para nos consertarmos.

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