Sustentabilidade para o Século XXI


Meio-ambiente não é a herança de nossos pais, mas o que tomamos emprestado de nossos filhos!


Poucos conceitos têm sido tão falados nos tempos atuais como SUSTENTABILIDADE. O conceito de SUSTENTABILIDADE ORGANIZACIONAL tem sua origem nas discussões sobre meio-ambiente e preservação do planeta. Desde o alerta sobre as condições climáticas que estão comprometendo nossa sobrevivência e qualidade de vida, iniciado com a Toronto Conference on the Changing Atmosphere, no Canadá, em outubro de 1988, e reforçado com a ECO/92 no Rio de Janeiro e o Protocolo de Quioto em 1998, no Japão, as organizações de todo mundo foram chamadas a questionarem suas atividades e seus propósitos empresariais. Depois de mais de dois séculos de industrialização as pessoas estão perguntando qual a responsabilidade das organizações frente aos problemas de aquecimento global, poluição do ar, dos rios e mananciais de água potável, desertificação dos continentes e carência de produtos para alimentar a humanidade. Tais problemas não se abatem apenas sobre os que poluem ou os que especulam com as riquezas da terra, mas afeta a sobrevivência e a nossa qualidade de vida.
Este questionamento não cessou, pelo contrário. O conceito de Sustentabilidade Organizacional invadiu os ambientes empresariais e passou a ser alvo das preocupações de gestão dos empreendedores e executivos. O conceito que originalmente estava relacionado com a proteção do meio ambiente se expandiu para a qualidade de vida de todos os cidadãos. De forma simples, pode-se definir Sustentabilidade Organizacional como a capacidade que uma organização tem para definir suas estratégias mercadológicas a partir da responsabilidade social com as comunidades. Como todas as empresas estão de alguma forma, envolvidas no processo de globalização de seus negócios, as preocupações com a qualidade de vida das populações adquire contornos mundiais.
Uma organização hoje não pode apenas pensar em termos de lucro, mas precisa responsabilizar-se pelos impactos de seus negócios sobre os ambientes “Eco-humanos” onde atua direta ou indiretamente. Há muito tempo que as organizações responsáveis trocaram sua gestão orçamentária por uma gestão estratégica. Em vários países as Bolsas de Valores introduziram o conceito de Sustentabilidade criando um Índice de Sustentabilidade Empresarial – ISE, como no caso da Bolsa de Valores de são Paulo, cuja valorização das ações havia superado os 90% em dois anos.
Estamos passando por um “dilúvio” financeiro mundial poucas vezes visto na história da humanidade. Essa catástrofe se alarga e estende a passos largos para todas as esferas de atividade humana projetando uma crise global sem precedentes, a tal ponto que organismos e personalidades mundiais já falam em uma NOVA ORDEM MUNDIAL. O que exatamente será essa “nova ordem mundial”, ninguém sabe. Mas uma coisa todos os analistas concordam, não será mais possível sobrevivermos debaixo de um projeto global que não se volte mais seriamente para as grandes demandas sociais em todos os rincões do planeta. Então a pergunta parece óbvia: quem e quais organizações estão mais preparadas para enfrentar a atual crise e ser vanguarda nessa “nova ordem”?
Empresas e organizações em todos os lugares precisam de protocolos diferentes aos que outrora parecem ter funcionado. No começo do século XX o grande paradigma organizacional foi a linha de produção especializada de Taylor e a administração científica de Fayol. Há um século iniciava-se a fabricação do Modelo T e em 1913 Henry Ford implantou a linha de montagem em série. Em 1925 o Modelo T custava US$ 260.00 e era montado em 96 minutos. Além disso, o espírito empreendedor de Ford fez com que financiasse a venda de seu carro aos funcionários de sua fábrica, o que se mostrou uma poderosa estratégia de promoção. Como se pode ver, as melhores práticas de gestão sempre andaram de mãos dadas com o crédito e o merchandising. A administração como ciência moderna inaugurou uma parceria que se nos últimos cem anos se mostrou algo vitoriosa do ponto de vista financeiro, deixou como conseqüência uma série de problemas a serem desenovelados pelas gerações futuras de gestores. As crises de 1929 (Crack), a Segunda-Feira Negra de 1987, a Crise Asiática de 1997, a Crise na Rússia de 1998 e a Bolha da Internet em 2000 não foram capazes de incentivar líderes e gestores mundiais a repensarem seus protocolos de gestão que ditam regras desde o início do século vinte.
Destarte as iniciativas precursoras implantadas nos países asiáticos no pós-guerra, como a Administração da Qualidade, cujos paradigmas pelo menos em alguns aspectos são díspares do preconizado pelo taylorismo – por exemplo, o conceito de “público geral” por detrás do TQC – Total Quality Control ou a prática da “produção puxada” preconizada pelos modelos Lean no STP - Sistema Toyota de Produção -, a verdade é que organizações globalizadas do mundo atual resistiram e ainda resistem fortemente a mudarem seus instrumentos de trabalho e suas visões que não sejam em direção ao valor financeiro de suas ações. Assim, pouco se caminhou ainda no sentido de práticas que efetivamente coloquem o lucro como resultado e não como objetivo administrativo empresarial. Diante do ápice de desmandos acumulados nos últimos cem anos, a sociedade humana, de forma geral, padece de “doenças” endógenas a um sistema gerenciado de forma irracional e pouco voluntarioso quanto às questões de impacto efetivo das operações industriais sobre a vida de todos nós.
Sustentabilidade é responsabilidade social com as comunidades que povoam os ambientes organizacionais, em seu interior e em seu entorno. Do ponto de vista da Sustentabilidade Organizacional as notações por detrás das práticas ortodoxas precisam ser revistas a partir de concepções humanísticas, não porque a filosofia, quiçá, chegou definitivamente às teorias administrativas, mas porque sem o fim dessa ortodoxia egoísta e imediatista, nem empresas nem consumidores estarão mais aqui para fazerem o mercado acontecer. Quem sabe, estamos mais perto do escambo do que de formas mais avançadas de troca, e já não podemos dizer que aquela forma “autônoma” de troca não seja mais salutar do que o papel moeda nacional – por exemplo, muitos lugares, como na Islândia, estão fazendo isto e emitindo uma moeda local em substituição ao Krona, moeda nacional que muitos bancos do país não aceitam mais. A verdade que omitimos de forma freqüente é que a reprodução da vida em parâmetros saudáveis e com um grau aceitável de felicidade não depende das coisas que trocamos ou consumimos, mas sim da paz e harmonia em que interagimos com o meio-ambiente, aí incluído nossos semelhantes. Até o mais empedernido homem de negócios e o mais convicto individualista sabem que a sua qualidade de vida e uma vida boa remete inevitavelmente para a relação que se mantém com as coisas e com as pessoas.
Infelizmente aprendemos a especializar as atividades humanas a tal ponto que acreditamos comodamente que a responsabilidade sempre está além de nós. Esse ressentimento pessoal e profissional estendeu-se da especialização da divisão do trabalho social a profissões e atividades mais especificas, e nos esvaziou da preocupação e responsabilidade com a sobrevivência de nosso mundo e de nós mesmos. Sempre temos um responsável porque sempre achamos que cada atitude humana, profissional ou não, remete a uma ciência muito especifica, a um conhecimento muito elaborado, e que cada especialista deve cuidar de seu pedaço e nutrir a todos com essa eficiência tecnocrática. Nesse espiral criamos conceitos de gestão como Teoria dos Jogos, Controle Orçamentário, Negócios Inteligentes com base em Sistemas de Informação avançados. Mas destruímos a criatividade e inventividade voltadas para a vida boa, simples e feliz. Agora não sabemos mais quem é o responsável; ficamos nessa tautologia inexpressiva e indolente de que “onde todos são responsáveis, ninguém é responsável”.
Sustentabilidade Organizacional é do que se trata neste livro. Por iniciativa de um conjunto destemido e dedicado de professores, os textos que compõem este trabalho apontam para um único sentido. Ainda que por caminhos diferentes, mas não tão diversos que não possam se complementar, a gestão do futuro, que se concretizará neste século, redefine os alicerces produtivos e as formas financeiras e de comunicação organizacional em patamares mais responsáveis e mais éticos. Os discípulos de hoje são os gestores de amanhã. Sempre nos perguntamos que profissionais estamos formando. A responsabilidade dos mestres de hoje não é menor do que dos gestores. Não nos podemos furtar a essa missão, mas doravante as bases em que formamos os futuros profissionais precisam incorporar de fato a discussão sobre os impactos das ações e práticas organizacionais sobre a vida das pessoas e das comunidades em derredor.
As questões ecológicas e ambientais, as questões sociais e a geopolítica, serão pano de fundo para todas as disciplinas e conteúdos ministrados nos cursos de administração. Não circunscritas às disciplinas de formação propedêutica, que, aliás, nunca receberam destaque e importância nos cursos superiores em nosso país. Mas os cursos e os professores terão que se esforçarem mais para que a questão da Sustentabilidade esteja impregnada em todas as matérias, de forma tal que a formação de um futuro gestor possa fazê-lo sentir-se preparado e gratificado em poder contribuir com práticas organizacionais não predadoras como o foram até agora. Fundamentalmente, a formação dos novos e futuros administradores deve se especializar em gente, para que as pessoas possam ser mais importantes do que as coisas que adquirem ou possuem. Neste sentido, a discussão ÉTICA de nossa responsabilidade com o mundo que habitamos e do qual somos construtores, deve permear o sentido de nossa tarefa de educar, afinal responder de forma consistente à pergunta que líderes e gestores a humanidade precisa para sobreviver mais dignamente no futuro.
Ao final deste século, quem sabe, as gerações de administradores que nos seguirão, discutirão e implementarão práticas e definirão objetivos estratégicos que privilegiam mais a cooperação do que a simples destruição de concorrentes, mais o valor de uma organização pela produção sem impactos ambientais do que pela capacidade de gerar dividendos, mais a distribuição justa desses dividendos pelo esforço e empenho das pessoas no trabalho socialmente necessário do que pela agilidade em conceder crédito e especular em cima de ativos virtuais, mais pelo uso das técnicas de comunicação social em descobrir as necessidades e preferências dos consumidores, do que suscitar furores por artigos e serviços supérfluos cujo consumismo demonstra ser afinal danoso a todos no médio e longo prazo.

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